sábado, 12 de novembro de 2016


PROBLEMAS GERAIS DA LÍNGUA CULTA




“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.”



(Odes de Ricardo Reis – heterônimo de Fernando Pessoa)


            Este capítulo pretende oferecer a você orientações sobre aspectos gerais da língua portuguesa culta. Consiste, portanto, numa oportunidade de aperfeiçoar seu desempenho no que diz respeito à grafia e ao emprego apropriado de formas e expressões que costumeiramente causam problemas a quem pretende falar ou redigir português culto.
            Acreditamos que muitas coisas que veremos a seguir já foram estudadas em sua vida escolar anterior. Nesses casos, aproveite o que vamos dizer para avaliar seu conhecimento. É importante que você definitivamente incorpore tais detalhes ao seu manuseio escrito (e falado, nas situações apropriadas) da língua portuguesa.

FORMA E GRAFIA DE ALGUMAS PALAVRAS E EXPRESSÕES


Que e quê

            Que é pronome, conjunção, advérbio ou partícula expletiva. Por se tratar de monossílabo átono, não é acentuado:

(O) Que você pretende?
Você me pergunta (o) que farei. (O) Que posso fazer?
Que beleza! Que bela atitude!
Convém que o assunto seja discutido seriamente.
Quase que me esqueço de avisá-lo.

            Quê representa um monossílabo tônico. Isso ocorre quando um pronome se encontra em final de frase, imediatamente antes de um ponto (final, de interrogação ou exclamação) ou de reticências, ou quando quê é um substantivo (com o sentido de “alguma coisa”) ou uma interjeição (indicando surpresa, espanto):

Afinal, você veio aqui fazer o quê?
Você precisa de quê?
Há um quê inexplicável em sua atitude.
Quê! Conseguiu chegar a tempo?!



Por que, por quê, porque, porquê

            A forma por que é a sequência de uma preposição (por) e um pronome interrogativo (que). É uma expressão equivalente a por qual razão, por qual motivo:

Por que você pensa assim? (Interrogativa direta)
Preciso saber por que você pensa assim. (Interrogativa indireta)
Não sei por que você pensa isso.
Não deixe de ler a matéria intitulada “Por que os corruptos não vão para a cadeia”. É impressionante!

            Caso surja no final de uma frase, imediatamente antes de um ponto (final, de interrogação, de exclamação) ou de reticências, a sequência deve ser grafada por quê, pois o monossílabo que passa a ser tônico:


_ Ainda não terminou? Por quê?
_ Você tem coragem de perguntar por quê?

            Há casos em que por que representa a sequência preposição mais pronome relativo, equivalendo a pelo qual (ou alguma de suas flexões: pela qual, pelos quais, pelas quais). Em outros contextos por que equivale a para que.

Estas são as reivindicações por que estamos lutando. (= pelas quais)
O túnel por que deveríamos passar desabou ontem. (= pelo qual)
Lutamos por que um dia este país seja melhor. (= para que)

            Já a forma porque é uma conjunção, equivalendo a pois, já que, uma vez que, como:

A situação agravou-se porque muita gente se omitiu.
Sei que há algo errado porque ninguém apareceu até agora.
Continuas implicando comigo! É porque discordo de ti?

            Porque também pode indicar finalidade, equivalendo a para que, a fim de. Trata-se de um uso pouco frequente na língua atual:

Não julgues porque não te julguem.

            A forma porquê representa um substantivo. Significa causa, razão, motivo e normalmente surge acompanhada de palavra determinante (um artigo, por exemplo). Como é um substantivo, pode ser pluralizado sem qualquer problema:

Não é fácil encontrar o porquê de toda essa confusão.
Creio que os verdadeiros porquês não vieram à luz.



Onde e aonde

            A tendência no português atual é considerar a seguinte distinção: aonde indica ideia de movimento ou aproximação, opondo-se a donde, que exprime afastamento. Costuma referir-se a verbos de movimento:

Aonde você vai?
Aonde querem chegar com essas atitudes?
Aonde devo dirigir-me para obter esclarecimentos?
Não sei aonde ir.

Onde indica o lugar em que se está ou em que se passa algum fato. Normalmente, refere-se a verbos que exprimem estado ou permanência:

Onde você está?
Onde você vai ficar nas próximas férias?
Não sei onde começar a procura.



Mas e mais

Mas é uma conjunção adversativa, equivalendo a porém, contudo, entretanto:

Não conseguiu, mas tentou.

            Mais é pronome ou advérbio de intensidade, opondo-se normalmente a menos:

Ele foi quem mais tentou; ainda assim, não conseguiu.
É um dos países mais miseráveis do planeta.



Mal e mau

            Mal pode ser advérbio ou substantivo. Como advérbio, significa “irregularmente”, “erradamente”, “de forma inconveniente ou desagradável”. Opõe-se a bem:

Era previsível que ele se comportaria mal. Era evidente que ele estava mal-intencionado porque suas intenções haviam repercutido mal na reunião anterior.

            Como substantivo, mal pode significar “doença”; “moléstia”, em alguns casos significa “aquilo que é prejudicial ou nocivo”.   

A febre amarela é um mal que atormenta as populações pobres.
O mal é que não se toma nenhuma atitude definitiva.

            O substantivo mal também pode designar um conceito moral, ligado à ideia de maldade; nesse sentido, a palavra também se opõe a bem:

Há uma frase de que a visão da realidade nos faz muitas vezes duvidar: “O mal não compensa.”

            Mau é adjetivo. Significa “ruim”, “de má índole”, “de má qualidade”. Opõe-se a bom e apresenta a forma feminina :

Não é mau sujeito.
Trata-se de um mau administrador.
Tem um coração de mau.

            OBS.: É muito fácil empregar corretamente as palavras mal e mau: basta você substituir por bem ou bom. Se for possível substituir por bem, empregue mal; se for possível substituir por bom, empregue mau.



A par e ao par

            A par tem o sentido de “bem-informado”, “ciente”:

Mantenha-se a par de tudo o que acontecer.
É importante manter-se a par das decisões parlamentares.

            Ao par é uma expressão usada para indicar relação de equivalência ou igualdade entre valores financeiros (geralmente em operações cambiais):

As moedas fortes mantêm o câmbio praticamente ao par.



Ao encontro de e de encontro a

            Ao encontro de indica “ser favorável a”, “aproximar-se de”:

Ainda bem que sua posição veio ao encontro da minha.
Quando a viu, foi ao seu encontro e abraçou-a.

De encontro a indica oposição, choque, colisão. Veja:

Suas opiniões sempre vieram de encontro às minhas; pertencemos a mundos diferentes.
O caminhão foi de encontro ao muro, derrubando-o.



A e na expressão de tempo

            O verbo haver é usado em expressões que indicam tempo já transcorrido:

Tais fatos aconteceram há dez anos. (Nesse sentido é equivalente ao verbo fazer: Tudo aconteceu faz dez anos).

A preposição a surge em expressões em que a substituição pelo verbo fazer é impossível:

O lançamento do satélite ocorrerá daqui a duas semanas.
Partiriam dali a duas horas.



Acerca de e há cerca de

Acerca de significa “sobre”, “a respeito de”:

Haverá uma palestra acerca das consequências das queimadas.”

Há cerca de indica um período aproximado de tempo já transcorrido:

Os primeiros colonizadores surgiram há cerca de quinhentos anos.



Afim e a fim

            Afim é um adjetivo que significa “igual”, “semelhante”. Relaciona-se com a ideia de afinidade:

Tiveram ideias afins durante o trabalho.
São espíritos afins.

A fim surge na locução a fim de, que significa “para” e indica ideia de finalidade:

Trouxe algumas flores a fim de nos agradar.



Demais e de mais

            Demais pode ser advérbio de intensidade, com o sentido de “muito”; aparece intensificando verbos, adjetivos ou outros advérbios:

Aborreceram-nos demais: isso nos deixou indignados demais.
Estou até bem demais!

            Demais também pode ser pronome indefinido, equivalendo a “outros”, “restantes”:

Não coma todo o pudim! Deixe um pouco para os demais.

            De mais opõe-se a de menos. Refere-se sempre a um substantivo ou pronome:

Não vejo nada de mais em sua atitude!
O concurso foi suspenso porque surgiram candidatos de mais.



Senão e se não

Senão equivale a “caso contrário” ou “a não ser”:

É bom que ele colabore, senão não haverá como ajudá-lo.
Não fazia coisa alguma, senão criticar.

            Se não surge em orações condicionais. Equivale a “caso não”:

Se não houver aula, iremos ao cinema.



Na medida em que e à medida que

            Na medida em que exprime relação de causa e equivale a “porque”, “já que”, “uma vez que”:


Na medida em que os projetos foram abandonados, a população carente ficou entregue à própria sorte.

À medida que indica proporção, desenvolvimento simultâneo e gradual. Equivale a “à proporção que”:

A ansiedade aumentava à medida que o prazo ia chegando ao fim.




OBS.:Antes de fazer os exercícios, leia a teoria atentamente. Depois tente resolvê-los sem consultar. Caso você não consiga, releia a teoria até entendê-la. Não decore, aprenda!

Preencha as lacunas das frases seguintes com as formas entre parênteses.

a) Tenho muito o....................fazer. (que / quê)

b) É preciso um....................de louco para poder fazer isso. (que / quê)

c) Estamos rindo sem ter de.................... . (que / quê)

d) ....................você quer saber? É....................sua curiosidade é maior que sua inteligência? (por que / porque / por quê / porquê)

e) Você quer saber....................? Não lhe direi.................... . (por que / porque / por quê / porquê)

f) Resta ainda descobrir o....................dessas declarações. É difícil entender....................ele teria dito aquilo. (por que / por quê / porque / porquê)

g)....................está seu orgulho? (onde / aonde)

h) Irei....................você quiser que eu vá. (onde / aonde)

i) Não gosto muito dela,....................tenho que admitir que é....................inteligente do que eu supunha. (mas / mais)

j) Comportou-se....................durante a reunião. Não creio que seja um ....................sujeito, porém. (mal / mau)

l) Às vezes, penso que o ....................anda vencendo o bem de goleada neste nosso mundo. Isso é tão.................... ! (mal /; mau)

m).................... –humorados de todo o mundo, uni-vos! (mal / mau)

n) Deixe-me ....................de tudo o que estiver acontecendo. (a par / ao par)

o) Várias pessoas expuseram opiniões que vieram ..................................................minhas durante o debate, o que muito me animou. ( ao encontro das / de encontro às)

p) Muitas pessoas têm opiniões que vêm ..................................................às minhas, o que não chega a me desanimar. (ao encontro das / de encontro às)

q) ....................anos não nos vemos. E só poderei reencontrá-lo daqui ....................dois meses! (há / a)

r) Dali ....................três meses, eu mudaria de vida. (há / a)

s) Nada sei ....................das manifestações que ocorreram no país ....................de dois anos. (acerca / há cerca)

t) Já que temos ideias .................... , deveríamos trabalhar juntos ....................de conseguir melhores resultados. (afins / a fim)

u) Não há nada ....................em gostar ....................de doces. (de mais / demais)

v) ....................se fizer alguma coisa, o país escorregará para o caos. E ainda há quem não faça nada ....................perseguir privilégios. (se não / senão)

x) ..................................................que caminhávamos, podíamos perceber a mudança da paisagem. (à medida que / na medida em que)

z) O time melhorará....................sejam contratados novos jogadores. (à media que / na medida em que).

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FONTES:

36 LIÇÕES DE GRAMÁTICA – Ulisses Infante
GRAMÁTICA DA LÍNGUA PORTUGUESA – Pasquale & Ulisses

12 de novembro de 2016 – Sorocaba – SP.





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